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Reforma Tributária

Cashback Tributário na Reforma: Como Funcionará a Devolução de Impostos para Pessoas Físicas e Empresas

Entenda o cashback tributário da Reforma Fiscal brasileira. Uma análise técnica de como pessoas físicas de baixa renda receberão devolução do IBS/CBS e qual o impacto e os mecanismos para as empresas.

Autor: Ricardo de Freitas

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Cashback Tributário na Reforma: Como Funcionará a Devolução de Impostos para Pessoas Físicas e EmpresasReforma Tributária

A Reforma Tributária sobre o consumo, promulgada pela Emenda Constitucional nº 132/2023, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro um mecanismo com potencial significativo para promover justiça social e reduzir a regressividade do sistema: o cashback tributário.

Enquanto o Congresso Nacional se debruça sobre as Leis Complementares que detalharão sua operacionalização, a sociedade e os setores econômicos buscam compreender como essa devolução de parte dos novos tributos – o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – funcionará na prática, tanto para as pessoas físicas, público-alvo primário do benefício, quanto para o universo empresarial.

Este artigo propõe uma análise técnica e explicativa dos contornos já delineados para o cashback, suas finalidades, os prováveis mecanismos de funcionamento e os desafios inerentes à sua implementação em um país de dimensões continentais como o Brasil.

O Conceito e o Propósito do Cashback na Nova Arquitetura Fiscal

O cashback tributário, no contexto da reforma brasileira, refere-se fundamentalmente à devolução de uma parcela do IBS e da CBS pagos por pessoas físicas em suas aquisições de bens e serviços. Este instrumento não é uma novidade no cenário internacional, mas sua adoção em um sistema de IVA de base ampla como o proposto para o Brasil carrega um simbolismo e um potencial transformador consideráveis.

Mitigando a Regressividade: O Objetivo Social Central

O principal propósito do cashback é reduzir o caráter regressivo da tributação sobre o consumo. Sistemas que tributam predominantemente o consumo tendem a onerar proporcionalmente mais as famílias de menor renda, uma vez que estas comprometem uma parcela maior de seus rendimentos com a aquisição de bens e serviços essenciais. Ao devolver parte do imposto pago por essa parcela da população, o cashback busca aliviar essa carga, injetando recursos diretamente nos orçamentos familiares mais vulneráveis e, por consequência, estimulando a economia.

Incentivos Adicionais: Formalização e Cidadania Fiscal

Secundariamente, um sistema de cashback que exija a identificação do consumidor (via CPF na nota fiscal, por exemplo) pode atuar como um poderoso indutor da formalização das operações comerciais e do aumento da cidadania fiscal. A perspectiva de receber parte do imposto de volta pode incentivar os consumidores a exigirem o documento fiscal em todas as suas compras, auxiliando no combate à sonegação.

O Cashback para Pessoas Físicas: Detalhando o Mecanismo para o Cidadão

A Emenda Constitucional já estabelece que o cashback será direcionado, mas os detalhes finos de sua operacionalização serão definidos pelas Leis Complementares, que em maio de 2025 estão em fase avançada de discussão ou aprovação.

Quem Terá Direito? O Foco na Baixa Renda

O texto constitucional e os debates legislativos indicam claramente que o benefício será focalizado nas pessoas físicas pertencentes a famílias de baixa renda. Os critérios exatos para definir este público ainda serão detalhados, mas é altamente provável que envolvam:

  • Inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
  • Faixas de renda familiar específicas, a serem estabelecidas em lei.

Quais Produtos e Serviços Gerarão a Devolução?

A discussão aponta para a devolução do imposto incidente sobre o consumo de bens e serviços considerados essenciais. Embora a lista final dependa da regulamentação, alguns itens são frequentemente citados:

  • Gás de cozinha (GLP): Com potencial de devolução integral do IBS/CBS para a baixa renda.
  • Energia elétrica e água/esgoto: Possibilidade de devolução parcial ou total, considerando faixas de consumo.
  • Produtos da cesta básica: Para aqueles itens da cesta básica que não forem contemplados com alíquota zero do IBS/CBS, o cashback poderia ser um mecanismo para garantir a desoneração efetiva para a população de baixa renda.
  • Potencialmente, a devolução poderia ser mais ampla ou ter percentuais diferenciados para outros bens e serviços, conforme a capacidade de arrecadação e os objetivos de política social.

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O Mecanismo de Devolução: Da Compra ao Reembolso

A operacionalização do cashback exigirá um sistema tecnológico robusto e integrado:

  1. Identificação do Consumidor: Será imprescindível que o consumidor elegível informe seu CPF no documento fiscal no momento da compra dos produtos ou serviços que darão direito ao cashback.
  2. Cálculo Automático e Centralizado: Os sistemas da CBS (geridos pela Receita Federal) e do IBS (geridos pelo Comitê Gestor) deverão ser capazes de identificar as transações elegíveis, calcular o montante de imposto pago e o valor a ser devolvido, com base nas informações das notas fiscais eletrônicas (NF-e/NFC-e) vinculadas ao CPF do beneficiário.
  3. Forma de Recebimento dos Valores: Este é um dos pontos cruciais da regulamentação. As alternativas em discussão incluem:
    • Crédito direto em conta bancária (conta corrente, poupança ou conta de pagamento, como as de programas sociais).
    • Desconto automático em faturas de serviços públicos (ex: conta de luz).
    • Criação de uma “carteira digital” ou conta específica vinculada ao CPF, onde os valores de cashback seriam acumulados e poderiam ser utilizados para novas compras ou sacados.
    • Vinculação a cartões de programas sociais existentes.
  4. Periodicidade e Limites: As Leis Complementares também definirão a frequência da devolução (mensal, bimestral, etc.) e se haverá limites máximos de cashback por pessoa ou por família, para garantir a sustentabilidade fiscal do programa.

E para as Empresas? Existe “Cashback” ou Mecanismos Similares no Novo Sistema?

É importante distinguir o conceito de cashback direcionado à pessoa física de baixa renda dos mecanismos de recuperação de impostos inerentes ao sistema de IVA para as empresas.

A Não Cumulatividade Plena: O “Cashback” Estrutural das Empresas

Para a vasta maioria das empresas (especialmente aquelas que não optarem por regimes simplificados que restrinjam o crédito), o principal mecanismo de “devolução” do imposto pago é a não cumulatividade plena do IBS e da CBS. Isso significa que o imposto pago na aquisição de bens e serviços (insumos, ativo imobilizado, despesas operacionais que gerem crédito) poderá ser integralmente creditado, abatendo-se do imposto devido nas operações de venda ou prestação de serviços subsequentes. Este é o cerne do IVA: tributar apenas o valor agregado em cada etapa.

  • Funcionamento: As empresas apurarão seus débitos (IBS/CBS sobre suas vendas/serviços) e seus créditos (IBS/CBS sobre suas compras/aquisições). A diferença será o imposto a recolher. Se os créditos superarem os débitos em determinado período, gera-se um saldo credor, que, idealmente, poderá ser compensado com outros tributos ou ressarcido de forma ágil pelo Fisco.

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Empresas do Simples Nacional e o Desafio dos Créditos

A situação das empresas optantes pelo Simples Nacional é um dos pontos mais complexos da Reforma Tributária e da discussão sobre créditos. A forma como elas interagirão com o sistema de IBS/CBS – se gerarão crédito para seus adquirentes e em que medida – ainda depende de definições cruciais nas Leis Complementares.

  • Possíveis Cenários (em debate em maio de 2025):
    • Manutenção de um regime simplificado com recolhimento unificado e sem geração de crédito pleno para o adquirente (o que pode gerar perda de competitividade para o Simples ao vender para empresas maiores).
    • Opção para a empresa do Simples recolher o IBS/CBS “por fora” do regime simplificado, com alíquota cheia, para gerar crédito ao adquirente.
    • Um sistema de crédito presumido para os adquirentes de empresas do Simples.
  • Cashback para Consumidores de Empresas do Simples: Se o consumidor de baixa renda adquirir produtos/serviços de uma empresa do Simples, a regulamentação precisará definir como o cashback será operacionalizado, já que a empresa do Simples, em tese, não recolheria o IBS/CBS da mesma forma que uma do regime normal.

Outros Mecanismos e Impactos Indiretos para Empresas

  • Setores com Tratamentos Específicos: A reforma prevê alíquotas reduzidas, isenções ou regimes fiscais específicos para determinados setores (saúde, educação, agronegócio, cesta básica, etc.). Embora não seja um “cashback” no sentido de devolução direta, isso representa uma menor carga tributária efetiva para esses segmentos.
  • Incentivo à Formalidade: Se o cashback para pessoas físicas aumentar a exigência de nota fiscal em todas as transações, isso pode ter um efeito positivo para as empresas que já operam na formalidade, ao reduzir a concorrência desleal daquelas que sonegam ou operam informalmente.

Desafios e Pontos de Atenção na Implementação do Cashback Tributário

Apesar do nobre propósito, a implementação de um sistema de cashback em escala nacional é uma empreitada complexa e com diversos desafios:

  • Definição Precisa e Justa dos Critérios de Elegibilidade: Garantir que o benefício chegue efetivamente à população de baixa renda, evitando fraudes, exclusões indevidas ou a captura do benefício por faixas de renda mais altas.
  • Operacionalização Tecnológica Robusta: O sistema de coleta de dados (CPF na nota), processamento, cálculo e devolução dos valores precisa ser altamente eficiente, seguro, escalável e de fácil utilização para os beneficiários.
  • Comunicação e Educação da População: Será necessário um amplo esforço de comunicação para que os cidadãos elegíveis entendam como o cashback funciona, quais seus direitos e como proceder para receber a devolução.
  • Sustentabilidade Fiscal: O impacto orçamentário do programa de cashback precisa ser cuidadosamente dimensionado e previsto nas contas públicas, para não comprometer outras políticas essenciais.
  • Simplicidade do Mecanismo: É crucial que o sistema de cashback não se torne, ele próprio, um novo emaranhado burocrático para o cidadão.

O Cronograma: Quando o Cashback se Torna Realidade?

O cashback está intrinsecamente ligado à implementação do IBS e da CBS.

  • EC 132/2023: Estabeleceu a obrigatoriedade do mecanismo de devolução para pessoas físicas de baixa renda.
  • Leis Complementares (2024-2025 em diante): São elas que definirão os detalhes operacionais, os produtos/serviços elegíveis, os critérios para os beneficiários e a forma de devolução. Em maio de 2025, estas leis estão em fase crítica de aprovação e regulamentação.
  • Início da Operação do IBS/CBS: A CBS começa a ser cobrada (com alíquota de teste) em 2026 e entra em vigor plenamente em 2027. O IBS também tem início em 2026 (teste) e sua transição se estende até 2032, com plena implementação em 2033.
  • Vigência do Cashback: É esperado que o cashback comece a ser implementado gradualmente junto com a entrada em vigor do IBS e da CBS, possivelmente a partir de 2026 ou 2027 para alguns itens específicos (como o gás de cozinha, que tem menção explícita na Emenda Constitucional para uma devolução mais célere). A sua abrangência e operacionalização completa podem levar alguns anos para se consolidar.

O cashback tributário é uma das promessas mais progressistas da Reforma Tributária brasileira. Seu potencial para aliviar a carga sobre os mais pobres e promover a cidadania fiscal é imenso. Contudo, o sucesso de sua implementação dependerá da qualidade da regulamentação que está sendo definida agora, da robustez dos sistemas tecnológicos e de um esforço contínuo de gestão e aprimoramento. Para as empresas, o principal mecanismo de “retorno” do imposto pago continuará sendo a não cumulatividade plena do IBS e da CBS, mas os efeitos indiretos de um sistema mais formal e justo podem beneficiar a todos.


Resumo dos Pontos Centrais: O Cashback da Reforma Tributária em Detalhes

  • Objetivo Principal: Reduzir a regressividade da tributação sobre o consumo, devolvendo parte do IBS e CBS pagos por pessoas físicas de baixa renda em itens essenciais.
  • Funcionamento para Pessoas Físicas: Exigirá CPF na nota; o cálculo e a devolução (provavelmente via crédito em conta, desconto em faturas ou carteira digital) serão automatizados e definidos em Lei Complementar.
  • Empresas e a Não Cumulatividade: Para empresas, o principal mecanismo de “retorno” do imposto é o sistema de créditos e débitos do IVA (não cumulatividade plena), não um cashback direto como o das PFs.
  • Simples Nacional: A interação das empresas do Simples com o sistema de créditos e o cashback dos consumidores é um ponto crucial ainda em detalhamento.
  • Desafios de Implementação: Incluem a definição precisa dos beneficiários, a criação de um sistema operacional eficiente e seguro, a comunicação com a população e a garantia da sustentabilidade fiscal do programa.
  • Cronograma: O cashback será implementado gradualmente com a entrada em vigor do IBS e da CBS, a partir de 2026/2027, mas sua operacionalização completa e os detalhes dependem das Leis Complementares (em definição em maio de 2025).

A efetivação do cashback tributário será um teste importante para a capacidade do Brasil de implementar políticas fiscais que aliem eficiência econômica com justiça social.


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Ricardo de Freitas não é apenas o CEO e Jornalista do Portal Jornal Contábil, mas também possui uma sólida trajetória como principal executivo e consultor de grandes empresas de software no Brasil. Sua experiência no setor de tecnologia, adquirida até 2013, o proporcionou uma visão estratégica sobre as necessidades e desafios das empresas. Ainda em 2010, demonstrou sua expertise em comunicação e negócios ao lançar com sucesso o livro "A Revolução de Marketing para Empresas de Contabilidade", uma obra que se tornou referência para o setor contábil em busca de novas abordagens de marketing e relacionamento com clientes. Sua liderança no Jornal Contábil, portanto, é enriquecida por uma compreensão multifacetada do mundo empresarial, unindo tecnologia, gestão e comunicação estratégica.

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