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Revanche do Analógico: Em um mundo digitalmente exausto, mercado de brindes corporativos se reinventa com neurociência, ESG e tecnologia

Em um paradoxo que define a economia da atenção no século XXI, a nova fronteira da inovação em marketing pode não estar em um código de programação ou em um ambiente de realidade virtual, mas sim na sua caixa de correio ou na mesa do escritório. Após uma década de digitalização frenética, culminando em uma pandemia que nos confinou às telas, o mercado corporativo global atingiu um ponto de inflexão: a exaustão digital. Profissionais que recebem, em média, mais de 120 e-mails por dia – o dobro de cinco anos atrás – e são bombardeados por um fluxo incessante de notificações, desenvolveram o que psicólogos chamam de “dormência digital”.

Nesse cenário de ruído constante, onde a atenção se tornou o ativo mais valioso e volátil, uma indústria tradicional não apenas sobrevive, mas floresce ao se reinventar: a de brindes corporativos. Longe de ser um mero mercado de canetas e chaveiros, o setor de produtos promocionais no Brasil encerrou 2024 com um faturamento de R$ 3,1 bilhões e projeta alcançar R$ 3,47 bilhões em 2025, segundo dados do relatório “Setor Brindeiro no Brasil 2024”. Globalmente, as projeções são ainda mais expressivas. O mercado, avaliado em US$ 839,57 bilhões em 2024, deve saltar para US$ 919,94 bilhões em 2025 e, impulsionado por uma taxa de crescimento anual composta de 9,6%, pode ultrapassar a marca de US$ 1,24 trilhão até 2029.

O motor desse crescimento é uma mudança estratégica profunda. O marketing tátil, antes um item acessório no orçamento, agora é visto como uma ferramenta central na construção de relacionamentos de alto valor. “Vivemos a revanche do analógico”, afirma Renato Schaimberg, diretor da empresa de brindes Luminati Brindes, uma das principais empresas do setor no país. “O objeto físico tem uma taxa de abertura de quase 100%. Ninguém ignora algo que chega à sua mesa. Ele fura a bolha da indiferença digital e inicia uma conversa de uma forma que um e-mail, por mais bem escrito que seja, jamais conseguiria.”

A Neurociência do Toque: Por que um presente funciona onde o digital falha

A eficácia de um brinde bem planejado não é esotérica; está profundamente ancorada em mecanismos neurocientíficos e psicológicos que o marketing digital, por sua natureza efêmera, raramente consegue ativar com a mesma profundidade. A hática, ciência do toque, demonstra que a interação física com um objeto dispara uma cascata de reações cognitivas e emocionais. O simples ato de segurar um objeto físico ativa o que o economista comportamental e vencedor do Nobel, Daniel Kahneman, popularizou como “Efeito de Dotação” (Endowment Effect). O cérebro humano, ao ter contato tátil com um item, começa a processá-lo como se já o possuísse, atribuindo-lhe um valor intrínseco maior. Diferente de um banner que some com um clique, um objeto de qualidade permanece na mesa, na estante ou na mochila, servindo como uma “âncora cognitiva” que reforça a presença da marca de forma passiva e contínua.

Adicionalmente, a experiência do “unboxing” – o ato de desembalar um presente inesperado – desencadeia uma liberação de dopamina, o neurotransmissor associado ao prazer e à recompensa. Essa onda neuroquímica cria uma associação positiva imediata com a marca remetente, abrindo uma janela de oportunidade para a comunicação antes mesmo que a mensagem principal seja lida. Essa reação química positiva prepara o terreno biológico para a persuasão. 

Uma vez que o presente é recebido, entra em cena a “Lei da Reciprocidade”, uma norma social universal que nos compele a retribuir um favor. No ambiente de negócios B2B, essa retribuição raramente é uma compra imediata, mas se traduz em moedas sociais extremamente valiosas: a disposição para agendar uma reunião, a prioridade na resposta a um e-mail ou, simplesmente, a abertura para ouvir uma proposta comercial.

“O marketing tátil não é sobre o valor monetário do item, mas sobre a inteligência e a personalização por trás dele”, explica Schaimberg. “Um presente bem pensado mostra que a empresa fez sua lição de casa, que ela valoriza o tempo e a atenção daquele cliente ou colaborador. É uma demonstração de apreço que o digital não consegue replicar com a mesma intensidade. Ele transforma uma interação fria e transacional em uma relação socialmente carregada.”

A era do ABM Físico: o “Cavalo de Troia” ético para contas estratégicas

Onde o poder do marketing tátil se torna mais evidente é no universo do Account-Based Marketing (ABM), estratégia focada em contas de alto valor. Nesses cenários, os decisores C-Level são blindados por assistentes, filtros de spam e uma agenda lotada. O presente físico atua como um “Cavalo de Troia” ético, contornando as barreiras digitais e chegando diretamente às mãos de quem importa.

Um caso clássico, mas cuja psicologia permanece atual, é a campanha da Ariba (hoje parte da SAP) para executivos. A empresa enviou um Porsche Boxster de controle remoto de alta qualidade, mas com um detalhe crucial: o controle remoto não estava na caixa. A mensagem era clara e engenhosa: para completar a experiência e poder usar o brinquedo, o executivo precisava agendar uma reunião. A campanha explorou o princípio da Gestalt, a necessidade humana de completar padrões, gerando uma taxa de resposta extraordinária. A frustração de ter um objeto incompleto criou uma tensão cognitiva que só poderia ser resolvida através da ação desejada pela empresa: o agendamento da reunião. Foi uma aula de psicologia aplicada ao marketing B2B.

Mais recentemente, uma empresa de cibersegurança enfrentou o desafio de vender uma solução preventiva – algo difícil de tangibilizar, pois seu sucesso significa que “nada acontece”. Para ilustrar o perigo das ameaças ocultas, enviaram aos prospects uma lanterna de luz negra de nível forense. Junto, um cartão aparentemente em branco revelava, sob a luz especial, mensagens sobre vulnerabilidades de TI que passam despercebidas a olho nu. A metáfora física educou o cliente sobre o problema de forma visceral e interativa, transformando um conceito abstrato (ameaças digitais) em uma experiência tangível e memorável. O ato de revelar o perigo com as próprias mãos criou um senso de urgência e compreensão que um whitepaper em PDF ou um webinar jamais conseguiriam replicar.

Do Plástico ao Propósito: A revolução ESG e a economia circular no setor

Se por um lado a estratégia se sofisticou, por outro, a consciência do consumidor e a agenda ESG impuseram um novo e rigoroso filtro de escrutínio. O “marketing de aterro sanitário”, baseado em itens de plástico baratos, importados sem rastreabilidade e de vida útil curta, tornou-se um passivo reputacional. A tendência dominante para os próximos anos é o brinde personalizado com propósito, que materializa os valores da empresa.

O upcycling, ou reutilização criativa, surge como uma narrativa poderosa. No Brasil, projetos notáveis têm transformado resíduos em receita e impacto social. Um exemplo foi a parceria entre a agência de live marketing Netza e a Rede Asta, que transformou lonas de eventos em bolsas e mochilas confeccionadas por cooperativas de artesãs, gerando renda para mulheres em vulnerabilidade e eliminando o descarte de toneladas de plástico. Cada peça contava uma história, transformando o que era lixo em um objeto de desejo e conversa. A etiqueta do produto, muitas vezes contendo um QR code, direcionava para um vídeo mostrando a artesã que produziu aquela peça, fechando o ciclo da narrativa e conectando o destinatário final a uma causa real.

Outra vertente em forte crescimento é o “brinde solidário”. O Grupo SADA, gigante de logística, tomou a decisão estratégica de redirecionar uma verba de R$ 400 mil, que seria gasta em itens físicos de fim de ano, para apoiar a ONG Gerando Falcões. O “presente” enviado aos parceiros foi a comunicação desse impacto, mostrando que a relação comercial deles havia contribuído diretamente para uma causa social relevante. O engajamento emocional, segundo a empresa, foi imensamente superior ao de qualquer cesta de Natal tradicional, gerando um retorno sobre o investimento (ROI) em termos de fortalecimento de relacionamento e lealdade de marca que superou as expectativas.

“O brinde deixou de ser um objeto para ser um manifesto de valores”, analisa Renato Schaimberg, da Luminati Brindes. “Quando uma empresa escolhe um produto de uma cooperativa local, um item feito de material reciclado ou redireciona a verba para uma causa, ela está comunicando sua cultura e seu compromisso com a sociedade de forma tangível. E isso reverbera muito mais forte do que um logo estampado em um produto genérico.”

A caixa que constrói cultura na era do Trabalho Híbrido

A consolidação dos modelos de trabalho remoto e híbrido dissolveu as paredes do escritório, mas não a necessidade de cultura e pertencimento. Nesse novo paradigma, o kit de boas-vindas (onboarding) assumiu um papel protagonista, tornando-se, muitas vezes, o primeiro e único ponto de contato físico entre a empresa e o novo colaborador. Deixou de ser um mero pacote de material de escritório para se tornar uma experiência de “unboxing” cuidadosamente projetada para gerar orgulho e conexão imediata.

Empresas de tecnologia, em uma acirrada disputa por talentos, lideram essa tendência. A startup de benefícios Caju, por exemplo, desenvolveu uma jaqueta dupla face de alta qualidade – um lado vibrante com a marca, para eventos, e outro neutro e discreto, para o dia a dia. A versatilidade e a qualidade do item garantiram seu uso fora do ambiente de trabalho, transformando os colaboradores em embaixadores da marca de forma autêntica. A onda de compartilhamentos espontâneos no LinkedIn e Instagram gerou um alcance orgânico e uma prova social muito mais poderosa do que qualquer anúncio de recrutamento pago. O iFood, por sua vez, inclui em seus kits miniaturas 3D de suas icônicas mochilas de entrega, transformando-as em totens culturais que decoram as estações de trabalho dos “FoodLovers”.

“O onboarding é o momento mais crítico para reter um talento. Um kit bem executado diz ao colaborador: ‘Nós investimos em você, nos importamos com sua experiência e estamos felizes em tê-lo aqui’. É o começo de uma relação de lealdade, um gesto que comunica valor de forma muito mais eficaz do que um parágrafo no manual da empresa”, finaliza Renato Schaimberg.

O futuro é Figital: dados, IA e a hiper-personalização do brinde

O próximo passo na evolução do marketing tátil é a fusão completa com a análise de dados e a inteligência artificial, um conceito que o mercado apelidou de “figital” (físico + digital). A personalização deixará de ser apenas sobre imprimir um nome em uma garrafa térmica personalizada. A IA poderá analisar o perfil público de um executivo no LinkedIn, seus interesses e publicações, para sugerir o presente ideal. Se um CIO é um corredor ávido, em vez de receber mais uma garrafa d’água genérica, ele poderia receber um tênis de corrida de última geração, personalizado com as cores da sua empresa e uma mensagem que faz referência a uma de suas conquistas recentes.

A impressão 3D também promete revolucionar a logística, permitindo a criação de itens únicos e sob demanda, reduzindo a necessidade de grandes estoques e o desperdício. A combinação de dados para prever o desejo e a tecnologia para produzir o item perfeito em tempo real representa o ápice da personalização em escala.

No fim, em um futuro que se desenha cada vez mais digital, povoado por avatares e assistentes de IA, a estratégia mais disruptiva e eficaz pode ser, ironicamente, a mais fundamentalmente humana: um gesto de apreço que se pode, de fato, tocar e guardar.

Renato Schaimberg. Diretor da Empresa de Brindes Luminati Brindes
Carlos Eduardo

Faço parte da equipe de redação e publisher do Jornal Contábil, ajudando na produção e publicação de matérias e notícias para manter os leitores bem informados sobre concursos, legislação e temas do dia a dia.

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